Ars Goetia

- Sentiu tanta saudade assim?

♙ Maxwell deu uma risadinha. Estava mais tranquilo do que antes, parecendo ficar até mesmo mais relaxado perto da Cognitiva ao contrário da maneira levemente nervosa que ele tinha antes. Não podia dizer que tudo isso se dava ao fato de ele ter transado com Melissa no final de semana, mas sim porque agora já não tinha mais duvidas sobre como se sentia em relação à Melissa e nem mesmo sobre como ambos deveriam prosseguir. ♙

- Pronta para prosseguir ainda mais?

- Aposto que adorou essa aproximação.

♙ Como sempre aqueles seres escolheram não falar nada enquanto Maxwell conversava com a Cognitiva, era como se estivessem assistindo um acidente prestes a acontecer. Uma pessoa normal tentaria parar aquilo antes que algo de ruim acontecesse, mas eles não eram normais e era muito curiosos sobre o que iria acontecer com eles. Como haviam dito antes, para eles pouco importava se Maxwell ganhasse ou perdesse, no final das contas tudo o que buscavam era um pouco de entretenimento. ♙

- Você não me engana, é claro que quer prosseguir. Gosta das batalhas e dos prêmios que vem depois.

- Vai ter que esperar.

♙ O passo que dera para com o seu relacionamento com Melissa fora algo que o ajudara a deixar seus desejos sob seu controle, pelo menos a maior parte deles, já não estava sedento por alguém como antes e apesar de ainda perder o controle quando estava com Melissa, Maxwell conseguira criar uma linha entre ela e a sua Cognitiva. Aquelas brincadeiras, flertes e toques não eram nada mais que um teste para ambos, Maxwell tinha que resistir seus impulsos carnais e a Cognitiva tinha que conseguir tirar algo dele. ♙

- E agora consegue viver sem? - A pergunta foi feita com uma sugestão de um sorriso desenhando-se em seus lábios. - É claro. Mas depois de avançarmos mais um pouco hoje.

- Você gosta quando eu sou cruel.

♙ Maxwell abriu um leve sorriso de perversão logo após falar aquilo. Apesar de certamente não ser a maneira como a Cognitiva gostaria que ele agisse, era uma que causava um certo efeito nela e Max havia notado isso. Se falasse assim com a Melissa ela certamente apanharia tanto que se saísse do hospital seria um milagre, e seria estranho se acabasse funcionando de alguma maneira. Tentou afastar aqueles pensamentos conforme caminhava, a linha vermelha aproximando-se cada vez mais. ♙

- Ah é? Sabe que sem as batalhas, não tem os prêmios não é? Você me perde junto nisso tudo aí. - Gostaria de ver até onde a Cognitiva o desejava e até onde aquilo era provocado pela imagem que Melissa tinha de si mesma. - Leve-as por enquanto.

- Talvez eu deva ser mais cruel ainda.

♙ Ele disse aquilo de uma maneira intencionalmente maliciosa, porém não era algo que realmente planejava fazer. Apesar de todas aquelas brincadeiras e trocas de gracejos que tinha com a Cognitiva, ele tinha que reconhecer que ainda não passara do limite justamente por ter criado algumas barreiras entre ele e os seus desejos mais carnais. Se ele gostaria de passar algumas horas com a Cognitiva? É claro, da mesma maneira que adoraria passar algumas horas com Melissa, mas ali havia uma enorme diferença. ♙

- Você é cheia de marra não é mesmo? - Maxwell colocou sua mão direita em uma das coxas dela e apertou com força. - O seu prêmio está bem planejado, não se preocupe.

- Estamos chegando. - Ose quebrou o silêncio daqueles seres. - Guardem suas fantasias para outra hora, temos inimigos acima. - No céu rodeavam algumas criaturas, seus corpos eram humanoides e elas eram tão magras que poderiam ser esqueléticas mas a pele vermelha era reconhecível, suas cabeças lembravam muito as de um leopardo, porém mais finas e pontudas e traziam lanças em suas garras. - No momento que entrarmos, eles vão atacar.

- Talvez eu goste.

♙ A partir do momento que passaram aquela linha avermelhada as criaturas soltaram uma espécie de guincho e começaram a sua descida. Eram quatro num total e Ose logo deu combate contra dois dos monstros enquanto Aero cuidava do terceiro. Pixie, por sua vez, começou a cantar e logo os três guerreiros do grupo sentiriam sua força aumentando, um resultado da magia executada pela criatura que agora estava pousada em cima da cabeça de Maxwell. O quarto monstro avançou contra a Cognitiva. ♙

♙ Os quatro monstros logo foram liquidados, com aquele que fora atacado por Melissa soltando guinchos agudos conforme morria queimado. Logo tornou-se uma fumaça negra de forma parecida com os outros. Porém, não era um momento de comemoração ainda, na distância mais daqueles monstros com tridentes se aproximavam, haviam enfrentado estes no primeiro dia em que Maxwell começara a atuar como Peão no Tabuleiro. Eram três, um para cada um dos combatentes. ♙

- Bom, vamos dar cabo desses aí e seguir em frente. - Disse Maxwell e logo Ose e Aero avançaram, com a Cognitiva certamente em seu encalço.

♙ Maxwell, por sua vez, caminhava um pouco mais distante do grupo. A magia de Pixie ainda alcançava-os, aumentando suas habilidades físicas, mas num geral o rapaz buscava ficar longe das batalhas. Não queria ficar no caminho e também não desejava ser atacado uma vez que claramente não podia defender-se das criaturas. Apesar de saber lutar bem o suficiente para se defender no mundo real, um soco dele não faria nada contra os monstros, logo era limitado as cartas em momentos de emergência, porém estas afetavam os seus aliados e não ele em específico. Conforme o combate se desenvolvia, despercebido aos demais, mais um monstro voador surgiu do topo de uma casa. Ele ergueu voo e foi diretamente contra Maxwell. ♙

- Atrás! - Gritou Pixie, notando a súbita aproximação. O rapaz conseguiu saltar para longe, a lança quase atingindo-o, mas o monstro logo avançou novamente, preparado para atravessar o humano com a sua arma.

♙ Maxwell manteve seus olhos naquela Cognitiva. Piscou algumas vezes. Mas seu rosto não alterou-se de uma expressão completamente neutra por um longo tempo. Ele aproximou-se lentamente dela ergueu sua mão e acariciou o cabelo da Cognitiva de Hanna, olhou-a de cima a baixo mais uma vez e então olhou para a Cognitiva de Melissa, apontou para Hanna e então seu queixo finalmente foi ao chão. Ele esperava encontrar as versões Cognitivas de seus amigos, tanto que não se espantara muito na primeira vez que vira Melissa, mas aquilo era completamente diferente. A Hanna parecia-se com uma heroína de um desenho japonês. ♙

- Eeh... Que? - Ele disse, era importante notar que ainda estava acariciando os cabelos dela. - Mas... Isso vai contra tudo o que eu imaginei e ao mesmo tempo faz sentido.

♙ Maxwell não se dignou a responder a Cognitiva, continuava impressionado demais com o que estava vendo. O fato da cognitiva de Hanna ser uma heroína não o espantava, visto a maneira como a versão real agia com os amigos e pessoas próximas era apenas natural que visse a si mesma como uma pessoa que tinha o dever de ajudar e salvar as outras, o que realmente o deixava espantado era a aparência que ela tomara. Por fim parou de acariciar o cabelo de Hanna. ♙

- Então... Você vai me ajudar? - Maxwell abriu um sorriso calmo. - Quanto mais gente melhor.

♙ No momento que falou isso, um pouco mais a frente do grupo, um monstro caiu dos céus aparentemente tendo sido jogado de cima de um dos prédios. Possuía uma aparência humanoide, porém seus braços e pernas eram mais longos do que o normal e a sua cabeça assemelhava-se a de uma mosca. Segurava fracamente em sua mão uma espada com a lâmina quebrada e mal conseguia se erguer devido ao impacto das suas costas com o chão. Antes que qualquer um pudesse reagir ou atacar, algo desceu dos céus em cima do monstro e som de carne sendo perfurada soou alto. Quem matara o monstro era um cavaleiro em uma armadura negra com azul escuro, carregando uma espada longa partida em algumas partes e claramente começava a enferrujar. O rosto desse cavaleiro estava parcialmente escondido por um longo cachecol azul escuro, mas no momento que ele levantou-se e guardou a espada em suas costas o rosto tornou-se familiar. Cabelos loiros caíam por seu rosto, mal cuidados e um pouco sujos, e olhos azuis claro observavam à todos. ♙

- Achei vocês. - Falou a Cognitiva de Dante. - Não pensei que seriam tantos.

- Eu já não sei mais o que dizer. - Disse Maxwell, tentando encontrar palavras. Seu melhor amigo via a si mesmo como um herói caído, não sabia se achava isso irônico ou idiota.

- Eu... Eu não teria me aproximado, mas vocês não tem muito tempo em mãos. - Explicou-se o Dante Cognitivo.

♙ No peitoral de sua armadura encontrava-se as inicias GW, provavelmente uma marca de seu antigo nome e era a única parte de toda a sua aparência que encontrava-se menos danificada. Dante encontrava extrema dificuldade em abandonar o seu passado e os erros que cometera durante ele, mesmo sendo uma pessoa diferente. Vendo aquela armadura, Maxwell conseguia imaginar que em dias melhores ela teria sido brilhante e reluzente, que a espada dele teria uma aparência mais bela e digna. Mas ali... Ali ele estava quebrado. ♙

- Hanna. - Disse Dante, porém ele ainda não conseguia olhar para ela.

- Bom... Essa aparência é... Algo. - Maxwell coçou sua nuca, apesar de conseguir compreender as aparências de seus amigos, tinha que admitir que ia contra tudo o que imaginava. - Então você vai ir com a gente também?

- Sim. Espero que eu seja de alguma ajuda. - Dante aproximou-se, ainda que mantivesse certa distância. - Isso é, se puder aceitar alguém como eu no seu grupo.

- Vamos. - Decidiu Maxwell.

♙ Sabia bem que os Cognitivos não tinham relações estáveis entre si, pelo menos não como era na vida real. Era para serem um reflexo das pessoas reais, porém com uma overdose dos pontos que cada um pensava sobre si. Por vezes a pessoa não precisava parar e pensar nisso, apenas a opinião que tinha sobre si, ou o modo como pensava, era o suficiente para defini-la. Mesmo que estivesse possivelmente errada. Mas ali... Ele via pedaços de cada uma das pessoas que conhecia, cada pessoa que amava. E a pior parte é que ele não fazia a menor ideia de como começar a ajudá-los. Por fim suspirou, seu dedo indicador subindo e cutucando a parte inferior de um dos seios de Melissa, para que ela os retirasse dali e então pôs-se a andar. ♙

- Eu andei observando algumas coisas mais à frente. - Disse Dante, que ficara um pouco mais à frente de Maxwell. - O lugar onde fica a efígie está guardada por dois guardas, eles são enormes. Não vi nada do ser que os controla, só eles mesmo.

- Garotinhas más são punidas, sugiro que se controle. - Alertou Maxwell para a Cognitiva de Melissa.

♙ Tinha em mente o fato de que aquilo a deixaria ainda mais abusada, mas naquele momento estava perdendo um pouco da sensação de perigo que o cercara todas as vezes que viera até aquele local. Estava rodeado de seus amigos, mesmo que não fossem eles de verdade ainda eram semelhantes e eles sempre o faziam sentir-se bem. Os seres que Louis arranjara para ele eram até mesmo esquecidos, enquanto em outros momentos serviam como uma lembrança mórbida do que tinha que fazer ali. ♙

- Não sei dizer muito mais sobre os dois, mas eles são fortes. - Dante falou, enquanto caminhavam. - Imagino que quem controla eles seja ainda mais forte.

- Só vamos descobrir isso enfrentando eles. - Disse Maxwell, que não tomaria parte na luta. - Vamos deixar esse líder por último. Detonamos os guardas dele e só voltamos dois ou três dias depois, até lá a paranoia já deve ter pego ele.

- Não vamos chegar até eles tão rápido assim. Seria fácil demais. - Disse Maxwell. - Aliás, Dante... Cognitivo. CogDante. Porque ele se vê assim?

- Assim? - O Cognitivo parou por um momento, para olhar para baixo, para sua armadura. Então ergueu sua cabeça e continuou a caminhar. -Dante não via a si mesmo como um herói, mas como uma pessoa que poderia ser um. Um cavaleiro que lutaria pelo bem alheio. E então ele lembrou-se do que já foi. Não são todos que conseguem lidar com o que já foram e como agiram.

♙ Max se manteve em silêncio após aquilo. Acreditava no contrário do que Dante pensava sobre si mesmo, que ele era sim um herói e que estava progredindo e fazendo o bem para os outros. Mas palavras de fora raramente alcançam as pessoas, é difícil mudar uma opinião que alguém tem sobre si. E lidar com o que já foi... Maxwell estava lidando com isso fora do Tabuleiro, manchado pro resto da vida como um maluco que deveria estar em um hospício. E talvez devesse mesmo. Mas estava livre e estava mudando. Quando se lembrava de quem já fora e do modo que agira, sentia vergonha de si mesmo, queria poder voltar no tempo e encher a si mesmo de porrada por ser tão idiota. Aproximou-se da Mel Cognitiva, ela estando um pouco mais a frente dos espíritos que os acompanhavam. ♙

- Ficou braba? - Perguntou ele, em um tom que misturava culpa e brincadeira. - Eu pensei que ia gostar das punições que eu tenho em mente, acho que me enganei. Desculpa.