Estacionamento

- Seria muito chato, mesmo. - Ela disse aquilo sorrindo conforme sentia sua bochecha ser apertada, apesar de imaginar que a surpresa lhe traria reações... Negativas, talvez? Era algo que ainda queria fazer. Tanto porquê a ideia a excitava como por querer fazer algo com Edrik que ele tinha certeza que nenhuma outra fizera. - Você é muito pegável.

Ela riu. E então corou suavemente, virando seu rosto em outra direção. Não era para ele lhe deixar daquele jeito no meio de uma missão, mas Edrik parecia ter o dom de arrancar um lado menos brutal dela, um lado que era mais... Suave? Não sabia a palavra certa para ser aplicada ali, nunca sentira aquilo antes para poder definir o que era. Mas era o seu lado que desejava Edrik de outras maneiras, não só sexo, era a parte dela que fazia-a sonhar com encontros românticos, com momentos tão perfeitos que pareciam impossíveis de se tornar realidade. Momentos que até então foram pesadelos, pois ela assistia-os conforme outra estava com ele. Agora isso havia mudado, eram os sonhos que faziam-na acordar sorrindo.

- Humm, me dá um beijo? - Ela sugeriu perante a pergunta dramática de Edrik, rindo logo em seguida. - De nada, amor. - Natasha aproximou-se da janela, era um pouquinho alta, mas dava para passar por ela tranquilamente. Ela preparou-se para subir. - É nessas horas que eu deveria olhar para você e dizer algo como ''não fique olhando'', não é? Mas eu quero que você olhe, não desgrude os seus olhos, okay? - Ela começou a subir, fazendo o processo todo ser lento de propósito, e então estava dentro da mansão. Olhou para os lados e para cima. Nada. - Pode vir.

- Acho que vou dormir no seu apartamento hoje. - Ela riu, mordendo seu lábio inferior enquanto o olhava.

Natasha olhava para Edrik com paixão, mas tinha a tendência de fazer isso quando o mesmo não estava olhando. Por algum motivo envergonhava-se levemente com a ideia de mostrar aquele lado demais, um lado que não era a brutalidade e chacina encarnada, um lado que era mais humano e que tinha os mesmos desejos que uma garota comum de sua idade. Não apenas os sexuais, esses ela saciava constantemente com Edrik, mas o desejo da estabilidade de um relacionamento lhe era atraente, por mais impossível que fosse no momento viver algo cem por cento normal entre eles, por mais que soubesse que nunca realmente seriam apenas dois adolescentes normais aproveitando a juventude um ao lado do outro, eles estavam próximos disso e no fim das contas, isso bastava.

- Não sou fofa. - Ela disse, seu rosto avermelhando-se ainda mais. Ela quase podia sentir os olhos dele grudados nela, da mesma maneira como iriam estar dali algumas horas, mas não era o momento correto para ficar excitada. - Olhe bem, sua chance de ver melhor só vem depois.

Ela afastou-se um pouco da janela e sacou sua pistola, ficando em posição de guarda conforme Edrik entrava. A mansão era velha e já havia visto dias melhores, mas não estava totalmente ruim, o chão de madeira ainda estava fixo e uma escada que podiam ver de onde estavam encontrava-se em perfeito estado. Para trás deles haviam alguns quartos e pedaços de madeira espalhados, uma parte do forro havia quebrado-se junto do piso do andar de cima. Era uma mansão, logo haviam quartos demais para vasculhar.

- Vamos ter que otimizar o nosso tempo, não vai demorar muito até um otário olhar pra cá e ver que tem gente.

- Se eu ficar lá muito direto fica suspeito... Mas o perigo me incentiva à ficar lá. - Deixar os dois juntos era como ligar uma bomba e pedir para ela não explodir. Ambos sempre estariam um ao lado do outro, fosse em situações como aquela ou nos calores da cama. De uma forma ou de outra, estariam unidos. - Edrik... Eu não consigo ficar braba com você.

Natasha riu sem jeito, de fato não conseguia irritar-se com Edrik, em todas as outras vezes sempre fora uma raiva fingida e o mesmo valia para Nymeria. Mas os momentos de fofura logo foram deixados para trás. Nat aprendera algumas regras sobre homens e a percepção de atratividade da sociedade, aprendera como afastá-los e aprendera a atrai-los, também aprendera que seu corpo era extremamente provocativo. E, Edrik deveria estar careca de saber isso, ela usava disso o tempo inteiro para provocá-lo.

- Estou perplexa em saber que não estava considerando isso desde que saímos de lá. - Natasha repetiu antes de terminar de entrar na mansão, fazendo questão de dar uma bela visão para Edrik. - Eu já assisti filmes de terror suficientes para saber que se separar é uma péssima ideia, Scooby Doo ensina isso também. O que eu quis dizer é que poderíamos um cuidar das costas do outro e ir direto para lugares que acharmos mais importantes.

A resposta dela para tudo aquilo foi uma risada, ambos sabiam bem que tudo o que levava Natasha de volta para Edrik era amor, claro que havia o sexo e era ótimo, mas mesmo sem isso ela continuaria indo até ele. Era uma verdade que começaram aquele relacionamento de uma maneira acelerada e que ambos eram extremamente insaciáveis, mas haviam os momentos quietos também e eram esses que Natasha mais apreciava.

- Certo, continua mirando esse celular eu vou na frente e você fica atrás de mim. Sei que adora ficar atrás de mim.

Talvez, apenas talvez, um dia eles parassem com aquelas piadinhas sexuais. Ou não, ambos pareciam divertir-se com tudo aquilo. Natasha então se pôs a andar para a esquerda e chegaram na frente da porta principal, a mesma estava barrada e Nat fez questão de destravá-la só para o caso de uma emergência. Haviam então as escadas e duas portas abertas que levavam para a sala de jantar e não tinha nada ali, literalmente nada, a sala inteira estava vazia. Ela mirou sua arma para o topo das escadas e fez um sinal para Edrik.

- Vem.

Mesmo sem Edrik falar sobre sua vontade, Natasha sabia que ele o tinha e uma parte de si adoraria sentir a mão dele naquele momento, mas por estarem em território desconhecido e pela segurança dele estar em risco essa vontade foi apenas passageira, ou melhor dizendo, foi suprimida. Apesar de locais isolados e longe dos olhos alheios serem perfeitos para eles, assim poderiam sentir um ao outro sem a preocupação de serem pegos, ali não só era perigoso como estavam em uma missão e não poderiam se dar o luxo de pararem à todo momento para um beijo. Ou algo à mais.

Em questão de casamento, ela iria com Edrik até o cartório se fosse necessário, mas não entraria em um vestido. Até os achava bonitos, mas não pensava que combinavam com ela, na verdade apesar de Natasha certamente ser bruta e grosseira e encaixar-se mais nos parâmetros ''masculinos'' do que nos ''femininos'', seus gostos eram bem simples. Ela gostava de coisas bonitas, gostava de flores, gostava de vestidos (apenas de olhar para eles) e muitas outras coisas normalmente associadas à mulheres mais ''doces'' do que ela. Num geral, o casamento com o Edrik era plenamente aceitável, desde que ela pudesse ir de regata e com suas calças folgadas.

- Está mesmo, é? - Pergunta retórica, mas que possuía um toque de malícia. Imaginava que Edrik não fosse fazer nada e que se fosse seria algo breve, mas ela gostava de provocá-lo mesmo quando sabia que nada ia acontecer. Pelo menos não ali e não naquele momento. - Uma janela ao lado, talvez? Aqui está limpo, pra direita têm alguns quartos e um deles está com a porta aberta, pra esquerda têm alguns quartos fechados e acho que a porta no final leva pro sótão.

- Eu não acho que vou, não.

Ela riu, em sua mente diversos cenários diferentes aconteciam, todos extremamente prazerosos. Estava realmente quase tocando o foda-se para aquela missão, mas seu treinamento como uma membra-chave do Inverno Soviético não permitia tal coisa, portanto ela apenas focou-se no que estava na sua frente e continuou, mesmo com aqueles pensamentos pervertidos cutucando-a no fundo de sua mente. Assim que sentiu o corpo de Edrik contra o seu foi difícil dizer não para seus impulsos, mas conseguiu e apenas sorriu enquanto o sentia.

- Certo. A propósito. - Ela forçou-se levemente contra Edrik, conforme movia sua cabeça para olhá-lo. - É a sua arma que estou sentindo?

- Por que acha que estou me forçando assim? - Natasha deu um risinho, mas seguiu em frente.

O caminho feito até o quarto foi lento, mas seguro. O mesmo estava escurecido e não tinha janelas para o lado de fora, Natasha tocou em um interruptor enquanto mantinha sua arma voltada para o quarto e as luzes acenderam-se, revelando várias prateleiras ao longo da parede, haviam alguns livros aqui e ali, mas a grande maioria estava vazia. Havia uma mesa circular no centro do quarto, com quatro cadeiras em volta, e algo havia sido desenhado com giz no centro, um estranho símbolo que Natasha classificou como satânico, mesmo sem saber se realmente era ou não, haviam velas à muito apagadas e um livro aberto em um dos cantos da mesa.

Se Edrik o pegasse para ler, veria que detalhava o retorno de um antigo ser que fora roubado de sua verdadeira forma. Um ser sobrenatural e poderoso, que assumia diversas faces e nomes, o livro ensinava um ritual para essencialmente dar poder para este ser misterioso e em troca ele revelaria os mistérios do mundo. Também detalhava que, caso o mesmo recebesse poder suficiente, ele retornaria para o plano humano e iria conceder aos seus fiéis seguidores poderes inimagináveis. Uma lista com todos os nomes que ele já utilizara encontrava-se na próxima página, apesar de garantir que alguns de seus nomes mais antigos foram esquecidos. O primeiro era ''Tenebraemachia'' e o último fora começado a ser escrito, porém por algum motivo o escrito parou deixando para trás as letras ''Is''.

- Mas que merda é essa aqui? - Natasha olhou para a mesa, como o próprio Edrik adivinhara o cheiro era de sangue. Os rituais para dar poder ao Tenebraemachia envolviam sangue, muito sangue. Aquilo ali parecia ser um ritual em menor escala. - Isso aqui é satanismo.

Natasha olhou para o chão, seu pé perto de uma das marcas de sangue. Ela não pareceu ficar espantada, porém virou sua atenção para a porta e manteve a sua pistola mirada ali, ela já havia deixado muitos lugares parecidos com aquele, a diferença principal sendo que normalmente tinha mais sangue e as marcas não eram deixadas por uma espada, mas sim por seus punhos. Tudo aquilo servira para ela empurrar para longe a luxúria que naturalmente tinha por Edrik, focando sua atenção na porta para se garantir que ninguém os atacaria pelas costas.

- Edrik, pegue esse livro e vamos. Podemos vir aqui em um outro horário ou com o resto do Inverno Soviético se preferir, mas essas marcas parecem recentes. - Natasha mantinha a mira na porta, não acreditava que estava concordando com Lennart, mas todo o preparo nunca era demais. E eles não se preparam o suficiente para aquilo. - Eu já não acho que esse lugar deve estar vazio e eu prefiro não lidar com os problemas que vem com matar um bando de cultistas malucos.

A arma de Natasha manteve-se erguida e apontada para Akira, estava em uma distância boa o suficiente para ver ele aproximando-se caso tentasse algo. Devido ao seu treinamento e às drogas do Inverno Soviético ela tinha reflexos sobre-humanos, logo iria ser capaz de reagir perfeitamente bem para um súbito avanço dele. Ouvira falar de Lennart, sobre como Akira parecia mover-se mais rapidamente que um ser humano normal e que não teria sobrevivido não fosse alguma coisa secreta da Casa ajudando ele à ficar vivo. Seus olhos já não desgrudavam mais de Akira, quatro disparos deveriam ser suficientes para lidar com ele caso o mesmo atacasse, a pistola que carregava não tinha muito recuo.

- Então o que está fazendo aqui?

- Se sabe que não somos um perigo para... O que quer que esteja fazendo, não somos bem pedras no sapato não é? Só temos algumas perguntas rápidas para fazer, só para garantir que não está fazendo algo que possa interferir com nós. Depois disso, vamos embora e esquecemos de você.

Era algo bom de se falar, um pouco surpreendente até vindo de Natasha de todas as pessoas, ela aprendera algumas coisas observando o modo como Sergei lidava com os outros membros e com as ocasionais pessoas que não precisavam ser eliminadas, portanto tinha uma noção de como apresentar uma oferta boa para outra pessoa. Mas aquilo tudo que falava tinha uma falha importante e que Natasha rezava para não ser o caso, porém se o que haviam visto era extremamente sigiloso para a missão de Akira e se saberem da presença dele naquela mansão em específico fosse um problema, então não haveria muita conversa ali. Ela manteve a arma erguida e apontada.

- Hanna! - Exclamou de imediato, voltando seus olhos na direção de onde ouvira o chamado e abriu um belo sorriso no momento que seus olhos caíram sobre ela.

O rapaz usava de uma calça jeans um pouco justa, assim como calçava seus tênis favoritos e tinha uma camisa social cinza fechada. Sempre fora modesto em suas escolhas de roupas, nunca utilizava nada que pudesse chamar muita atenção ou que o deixasse sentindo-se extravagante demais. No entanto, isso não importava. Recebeu Hanna em seus braços com um riso suave e correspondeu ao beijo dela de imediato, fazia-se apenas alguns dias desde que viram-se pela última vez, Dante tinha uma prova vindo portanto precisara de um tempo para estudar, agora que a prova já estava concluída ambos poderiam ir visitar Sigmund. A pergunta que Hanna lhe fez tornou o sorriso alegre de Dante em um de absoluto desespero, ele não sabia o que esperar daquilo, mas sabia que ia ser surpreendido de uma maneira ou outra.

- Meu pai é um pouco... Inconstante? Talvez seja essa a palavra certa. Mas enfim, ele não é uma pessoa que gosta de manter-se em uma única linha e está sempre alterando-se. - Dante riu, sabendo que aquela explicação não servia de muito. - Você vai ver ele hoje e então vai vê-lo várias outras vezes e em todas as vezes ele estará diferente.