Recanto da Nymeria

† Lennart apoiou Nymeria com cuidado, apesar de ter tratado do ferimento e ter deixado-a um pouco mais dormente para com a dor era importante impedir que os pontos se abrissem e tudo piorasse. Se pudesse, já teria matado Kuro, mas isso estava além das capacidades de um humano e era melhor evitar fazer qualquer movimento brusco na direção dela. Por dentro ele se odiava por ter prometido que passaria as informações para Akira, Sigmund normalmente o protegia quando Len fazia algo impulsivo, porém ele tinha a sensação de que daquela vez seria diferente e ele não ficaria nem um pouco feliz em saber que Lennart fizera tal promessa. Mais dor de cabeça pela frente, como sempre. †

- Vamos indo, Nym. Vou te deixar na porta enquanto trago os outros dois, se não acordarem.

- Isso ajuda.

† Lennart conseguia entender a frustração da parte de Nymeria, ou ao menos achava que compreendia, a rivalidade que ela possuía com Akira era antiga e ter um duelo interrompido daquela maneira deveria eliminar parte da diversão que havia no confronto. Ao menos era isso que ele imaginava, uma vez que não possuía rivais ou quaisquer relacionamentos similares à aquele. Desde que começara a treinar na Casa, Lennart se destacara e não tivera ninguém para competir com ele uma vez que esse tipo de coisa era desencorajada por Sigmund, que gostaria de ver seus assassinos trabalhando juntos e não um contra o outro. Havia uma pontada de uma nova emoção ali em seu coração, algo que ele nunca sentira antes. Ciúme. Mas de quem? De Akira por possuir um relacionamento como este com Nymeria? Ou ciúmes da própria Nymeria que tinha um adversário do qual poderia lamentar não poder enfrentar. Para ele os únicos inimigos que tivera não possuíram o menor pingo de respeito por Len. †

- Na mansão? - Sugeriu Natasha, contendo um bocejo enquanto olhava para os seus arredores. Suas memórias eram tão imprecisas quanto as de Edrik e ela ainda sentia um calafrio de pensar na existência aterrorizante que surgira atrás deles. - O que estão fazendo aqui?

- Viemos buscar vocês.

† Lennart não era um psíquico, ele não sabia dizer o que estava passando-se na mente de Nymeria naquele exato momento. Podia tentar adivinhar, é claro, porém seriam apenas conjunturas sem propósito ou razão, portanto seriam-lhe inúteis. Também queria evitar pensar demais naquilo enquanto ele próprio não conseguia reganhar sua compostura, era ridículo pensar que estava com qualquer tipo de ciúmes naquele momento, principalmente quando a pessoa que amava fora ferida de uma maneira que quase fora letal. Salvaria seus pensamentos para depois, se eles durassem até lá. †

- Sim, vamos descer e sair. Temos reforços do Inverno Soviético esperando aqui por perto. - Lennart falou e então olhou para Nymeria. - Prefere que eu te carregue?

- Esse ferimento parece sério... - Natasha mordeu o lábio inferior, irritada, queria ter estado ao lado de Nymeria para protegê-la. Na verdade só não estava xingando Lennart naquele momento por não saber a história completa. - Vamos descer logo.

† Lennart de bom grado carregou Nymeria, com todo o cuidado do mundo para não machucá-la enquanto iam para o carro. Quem dirigia o mesmo era Sergei, que rapidamente os levou para a segunda base do Inverno Soviético naquela cidade, um galpão que Nymeria conhecia muito bem e que fora utilizado para guardar armas e afins para usarem contra Shadow. Fora ali que ela conhecera Dancer, também. O local havia mudado desde a última vez em que estiveram ali, agora a maior parte do local estava vazio, várias divisórias com cortinas estavam separando e organizando o local para melhor funcionar para a movimentação de membros do grupo mafioso. Um dos médicos do grupo estava agora analisando o ferimento de Nymeria, tendo dado para ela algumas pílulas para aliviar a dor que ela estava sentindo, ela notaria que ficara mais fácil de respirar assim como a sua dor de cabeça sumira. †

- Não há, pelo menos não um que vá se manifestar. - Respondeu Lennart, olhando preocupado para Edrik. Notara que Nymeria estava distante, mesmo ela sendo fechada a garota normalmente respondia de uma maneira decente quando o assunto era sério.

- Vai precisar de algumas semanas de repouso. Minha senhorita vai precisar retornar daqui uma semana para que eu possa tirar os pontos, assim como para tomar uma segunda dose do remédio. - Disse o médico, com um sotaque russo pesado. - Eu gostaria de poder fazer mais, mas o único remédio melhor que temos eu não posso recomendar para a jovem princesa.

- É, aquela coisa não é feita para ser usada em casos como esse. - Concordou Natasha, todos ali sabiam que o Inverno Soviético possuía uma espécie de substância que costumavam injetar em seus feridos, normalmente fechando os ferimentos e reenergizando a pessoa. Porém este era feito para uma situação de vida ou morte e aquela não era uma delas. - Certo, certo. Vamos voltar um pouco. Tem um culto nessa cidade.

- Um palpite?

† Lennart questionou, um pouco distraído. A atenção dele ia de Edrik para Nymeria e vice-versa, estava nervoso para saber se Nymeria iria melhorar logo do ataque que sofrera, porém ainda assim queria saber o que a afligia tanto para deixá-la naquele estado. Era algo que o irritava na verdade, ele era tão bom em manipular outros e usar os sentimentos deles contra eles e ao mesmo tempo era péssimo em compreender os sentimentos de outras pessoas, como os que Nymeria estava tendo naquele momento. Nenhum treinamento da Casa havia preparado-o para isso, algo que ele sabia que era culpa sua uma vez que fora ele quem escolhera viver como um assassino ao invés de um ser humano comum. †

- Tenebraemachia... Nunca ouvi falar de algo assim. - Comentou Lennart, conforme o doutor se despedia de todos e saía para deixá-los a sós.

- Os livros diziam que ele é algo antigo e que vem se preparando para isso faz muito tempo. - Natasha falou, cruzando seus braços.

- Farei isso, pode deixar.

† Lennart começou a roer uma de suas unhas enquanto escutava tudo aquilo, não era como se a ideia de falar com Nymeria sobre o que a incomodava fosse algo ruim, era algo que faziam sempre que ela tinha algo em mente, porém ele não fazia a menor ideia de como falar sobre aquele assunto sem soar como um namorado ciumento. Fora treinado para diversos cenários onde deveria interpretar alguém, mas não fora preparado para aquela situação em específico. Decidiu mudar seu foco para a conversa atual, poderia pensar mais sobre isso depois. †

- O que eles estão realizando é real e perigoso, mesmo que o ser que cultuam não seja real eles estão realizando sacrifícios e eu duvido que eles estejam sacrificando apenas os membros desse culto. - Lennart parou de roer a unha por um momento. - Precisamos de mais informações, não temos muita coisa no momento. Nem sabemos onde é que eles estão agora.

- E atacar cegamente vai acabar fazendo com que a maioria se esconda por um tempo. Precisamos dar um único golpe decisivo. - Natasha estralou os dedos de sua mão enquanto falava. - Eles são perigosos demais para serem ignorados.

- Bom, estamos ouvindo.

† Lennart falou, voltando sua atenção para o Edrik. Não sabia dizer exatamente aonde o irmão de Nymeria se encontrava em relação ao pai, por vezes ele parecia ser muito mais leal à ele do que Nymeria e por outras seus tons de rebeldia demonstravam que ele talvez não fosse tão dedicado assim à Vlad. Lennart imaginava que ela estava, ou estivera, em conflito sobre como agir em relação à disputa do pai e da irmã e que não conseguira uma resposta que o satisfazia, Lennart ainda lembrava-se da expressão no rosto dele durante a reunião realizada após a queda de Shadow, era o rosto de alguém que não queria ver Nymeria sendo machucada, mesmo que suas expressões fossem extremamente sutis era apenas natural que Lennart as detectasse, fora treinado para fazer isso durante interrogatórios. Natasha cruzou seus braços e alterou o peso do corpo de um lado para o outro, olhando diretamente para Edrik enquanto esperava ele falar. †

- Oi?

† Foi tudo o que Lennart conseguiu falar, piscando forte algumas vezes. Nunca poderia ter imaginado os dois juntos, até por não ser muito chegado deles como por eles serem um par improvável, porém antes que Lennart pudesse falar isso ele considerou que ele e Nymeria também não poderiam dizer que eram um casal convencional. Porém os gêmeos pareciam ter o mesmo gosto em entrar em relacionamentos com seus guarda-costas. O que era mais impressionante naquela situação era que o rosto de Natasha incendiara-se e ela desviara o olhar para o canto daquele local, limitando-se a passar uma mão pela cintura de Edrik. †

- Você tem um jeito de fazer as coisas... - Natasha suspirou, não era bem assim que ela esperava revelar para aqueles dois o que realmente estava acontecendo entre eles, porém como era inevitável acontecer ela não reclamaria muito. - Só não sabemos quando.

- Não sei se há algo em você que eu não amo. - Caminhou até o lado de Edrik, cruzando seus braços e encostando-se nele. Natasha tinha um sorriso doce em seus lábios, algo que era extremamente raro de se ver dada as emoções extremas que ela costumava sentir, mas estava ali. Era algo singelo e até mesmo um pouco tímido.

Lennart por sua vez caminhou até o lado de Nymeria, escolheu não encostar-se nela por conta do ferimento que a mesma havia sofrido, porém passou seu braço ao redor dos ombros dela e sorriu para ela. Talvez tivesse realmente ficado óbvio demais o que ambos sentiam um pelo o outro, o modo desesperado como Lennart agira para salvá-la quando fora sequestrada, o costume que tinha se acariciar o rosto dela enquanto conversavam e até mesmo os sorrisos que colocava à mostra para ela ver eram excepcionalmente raros para uma pessoa que vivia do mesmo jeito que Lennart vivia. Entregara-se aos terrores de seus sonhos e de seu passado e nunca sequer pensara que poderia ter uma vida como essa, sequer achava que tinha direito de a possuir, porém agora que Nymeria havia entrado em sua vida e transformado tudo o que ele conhecia, Lennart jamais iria abrir mão dela. O amor que possuíam era grande demais para isso.

- Então o plano é lidar com ele para que possamos viver juntos? - Lennart questionou, acariciando suavemente o ombro de Nymeria em que sua mão estava.

- Se isso não é uma declaração de amor, eu não sei o que é. - Ela riu, segurando a mão de Edrik firmemente. - O que quer que decida, eu estarei ao seu lado até o final.

- Eu prometi estar sempre com você, assim como lhe ofereci a minha vida. Não preciso dizer que não te deixarei nem por um segundo que seja.

Lennart soubera do distanciamento entre Edrik e Nymeria apenas pelo o que ouvira de sua namorada e ela não era o tipo de pessoa que falava muito ou que entraria em detalhes sobre aquilo, apenas ouvira um comentário ou outro sobre Edrik estar quieto demais para o gosto dela e que não sabia até onde poderia confiar nele. Claro, tudo isso surgira nas várias vezes em que ambos sentiram a necessidade de sentar e debater aquele plano de matar Vlad, já haviam revisado tudo o que era possível e já haviam tido diversas conversas sobre como precisariam prosseguir e como deveriam lidar com os aliados da família após a morte dele, uma vez que não aceitariam que Vlad fosse morto e substituído daquela maneira. Porém um tópico que sempre surgira nessas conversas fora Edrik e Lennart estava feliz por não precisar mais ter de falar sobre ele como se fosse um inimigo.

- É bom ver vocês se entendendo de novo. - Natasha apertou suavemente a mão de Edrik e um de seus sorrisos brincalhões lhe veio aos lábios, apesar de suas brincadeiras normalmente serem maldosas.

- Creio que vocês deveriam, depois que Nym se recuperar, tirar um dia para que possam colocar todo esse peso para trás. - Lennart afagou de leve o ombro de Nymeria enquanto falava.

Tanto Lennart quando Natasha deram espaço para aquela cena que estava ocorrendo, ambos sabiam bem o quão importante aquilo era para os gêmeos e como precisavam daquele momento enquanto seguiam em frente. Lennart deu por si pensando nos seus colegas da Casa, alguns que considerava como irmãos e irmãs, não podia dizer que tinha um relacionamento muito bom com eles a grande maioria sendo enviada constantemente para todos os cantos do mundo em missões e mesmo os Treze Fúrias não eram um grupo tão unido assim. A exceção era Leah, porém ela sempre foi como uma amiga no meio de um grupo de pessoas que pareciam mais interessadas em si mesmas do que nos outros, não que Lennart pudesse julgar, ele próprio já fora assim. Quando pensava em Leah, os momentos mais quentes que dividiram passavam voando pela sua mente, uma breve memória de tempos mais desesperados, o que vinha eram as mensagens que ela deixava-lhe constantemente. Aparentemente ela sabia do relacionamento que ele possuía com Nymeria, dissera que ''não precisa ser um gênio pra notar o que está acontecendo'' e constantemente fazia perguntas sobre o seu bem-estar e o de Nymeria. Abriu um pequeno sorriso, que expandiu-se ainda mais quando sua atenção retornou para Nymeria e Edrik.

- Se vocês dizem. - Natasha deu de ombros e beijou a bochecha de Edrik, em uma de suas raras demonstrações de afeto que não envolviam algo mais... Íntimo.

- Talvez já esteja na hora de retornarmos para nossos lares. Já é tarde e se formos pegos entrando de volta na escola haverão questões que o dinheiro não calará. - Lennart beijou suavemente a têmpora de Nymeria antes de encostar sua cabeça na dela. Seus olhos desceram para encontrar os dela e, em um dos raros momentos em que ele demonstrava insistência, ele falou. - E você precisa descansar.

Passou seu braço pela cintura de Nymeria, apoiando-a conforme a mesma levantava-se. Lennart não estava cansado, até porquê tudo o que fizera na mansão fora andar e falar, diferente do que havia esperado, porém mal podia esperar para estar em sua cama onde poderia passar algumas horas olhando para o teto e pensando em certas coisas, devido ao ferimento de Nymeria ele imaginava que seria uma péssima ideia passar a noite com ela já que havia a chance de que ele acabasse apertando o local ferido sem querer enquanto dormiam e ela precisaria de todo o espaço possível para que pudesse ficar confortável na hora de dormir. Estando de pé ao lado de Nymeria, Lennart não conseguia tirar seus olhos dela e agora era algo que diferia-se da preocupação anterior, era um olhar extremamente apaixonado de uma pessoa que claramente estava afundada na paixão.

- Sei o que quer dizer, principezinho. - Natasha bocejou junto dele.

- Claro que vai sobreviver, não vou tirar meus olhos de você. - Lennart abriu um pequeno sorriso e deu um beijo na testa de Nymeria. - Vamos indo então, todos precisamos de um descanso.

- A Nymeria estava um pouco estranha.

Natasha falou e suspirou, puxando uma cadeira para si e se sentando logo em seguida. Não importando qual fosse a resposta da parte de Edrik, ela continuou a ficar quieta e perdida em seus pensamentos, olhando vagamente para a mesa enquanto tentava reorganizar a sua mente. Ela não tinha problemas em coisas sobrenaturais existirem, já havia visto tanta coisa na sua vida que aquilo já não a surpreendia mais. Ou, melhor dizendo, surpreendia de um modo que não era mostrado por ela. Porém ver Lennart e Nymeria juntos, ver os trocares que eles olhavam a fez perceber que não havia esse tipo de olhar em seu rosto, pelo menos não de um modo tão intenso quanto o deles. Perguntava-se se estava falhando com Edrik de alguma maneira, não entendia nada de amor.

- Eu já contei para você como eu era antes do Inverno Soviético?