Recanto da Melissa

Não havia passado muito tempo desde a conversa tensa entre Nathan e Lucian, a qual Melissa havia assistido pessoalmente e até instigado o que no final acabou sendo concretizado: ameaça. Pura e simples, porém daquela vez, aparentemente mais séria do que das outras vezes - não que tivessem ocorrido muitas delas.
Ainda assim, dessa forma, com a garota fora do quarto e com ele sabendo disso, não demorou até que o Prescott retornasse à área dos dormitórios, dessa vez, no entanto, rumando para o feminino. Ele seguiu pelo corredor com passos pesados, ignorando uma garota de cabelos ruivos que parecia deixar o local com um rapaz desconhecido. Assim que achou o que buscava desde o início - o quarto de Melissa - ele adentrou-o sem qualquer dificuldade - se estivesse trancado, o garoto tinha perfeitamente como abrir a porta arrombando a fechadura com o extintor para precaução de incêndio preso à parede.
Uma vez lá dentro, ele não demorou muito.
Nathan vasculhou o local como pôde, revirando-o mais do que já deveria estar e quando deixou o recinto, deixou também uma mensagem.
Sobre a cama de Melissa, havia uma foto em preto e branco. Do tamanho de uma folha de caderno, a imagem enquadrava o que parecia ser um banquete, com bandejas de comidas que não provocavam qualquer apetite... ainda mais se prestasse atenção que no centro da bandeja havia a cabeça de Melissa, recortada como se aquela imagem viesse de outra foto que não era esta, mas a garota não poderia se lembrar de ter posado para aquilo de forma nenhuma. De toda forma, seus olhos estavam riscados com um par de "X" e sua boca, que fumava um cigarro por entre os lábios, parecia completamente delineada para aparentar tristeza ou derrota.
Além de toda essa montagem de mal gosto, ali, pichado na parede com tinta vermelha que deveria dar um bom trabalho mais tarde para ser lavada dali - se é que era possível arrancá-la sem arrancar a parede junto -, por cima de qualquer posteres ou o que tivesse pregado no espaço, jazia uma mensagem clara e direta:

(Nathan é a pessoa mais adorável que existe, nossa. q
Não sei de respondo aqui de uma vez ou deixo pra fazê-lo depois dela sair do quarto do Lucian q)

(É por isso que ele é amado por todo mundo, pra não dizer outra coisa AJSIJASIDIASJDSJA
É você quem sabe diva, isso foi só pra "oficializar" a treta que vai esquentar -qq)

(Eu respondo quando souber a sacanagem que vou fazer. q)

Noah era uma variedade de coisas e uma delas era chamativo. Isso ia desde seu cabelo, pintado de um azul ciano, até suas roupas. Trajava-se com uma camiseta de manga curta branca, por cima desta estava um colete pink, usava calças jeans normais com uma cinta marrom, cuja ligação era feita de ferro. Seus coturnos eram pretos e demonstravam muito uso. Ele parecia ser um personagem que saíra direto de um festival dos anos 80/90, em sua boca havia um cigarro que já estava quase em seu fim. Noah deu uma última tragada e soltou a fumaça para o lado e em seguida jogou a bituca em uma lata de lixo qualquer. Apesar de seu visual um tanto diferenciado, era possível notar em seu rosto que ele era bem atraente, apesar de carregar uma cicatriz embaixo de seu olho direito.
Em suas mãos ele girava uma chave que exibia o famoso ''S'' da Suzuki, por fim ele parou em frente ao quarto de Melissa e tirou seus fones de ouvido, uma suave música vazava de dentro deles e tomava conta do ambiente mais próximo do rapaz.

- É, esse parece ser o local - Ele falou, olhando para a porta - Espero que eles estejam certos sobre ela.

Deu duas curtas batidas na porta e continuou a girar sua chave, enquanto esperava.

Era compreensível que Noah não tivesse ideia de que horas era, talvez fosse muito cedo, talvez fosse muito tarde. Quem vivia da mesma maneira que ele, eram poucas estas pessoas, tinham uma dificuldade enorme em manter seus olhos no relógio. Smith estava sempre fora, festejando, bebendo, fumando, se drogando e andando em sua moto, como ele mesmo costumava dizer '' Eu só estou aqui pela emoção ''. Era uma pessoa que gostava de sentir a adrenalina correndo em suas veias, talvez fosse por isso que dirigisse a moto que possuía, uma das mais rápidas do mundo, da última vez que checara ela ainda era a mais rápida mas podia ter saído alguma que a superara. Assim que Melissa abriu a porta, Noah a observou da cabeça aos pés com um pequeno sorriso em seu rosto.

- Você é a Melissa Carter, não é? - Perguntou Noah, estendendo sua mão para um cumprimento - Eu sou Noah Smith, mas meus amigos me chamam de Biker. Me falaram que você é a pessoa certa para se procurar quando se tem algum problema com sua moto.

No momento que Noah esticou sua mão foi possível ver uma tatuagem que ele carregava no seu antebraço, um círculo que parecia ter sido feito de sangue, com três riscos em seu meio, suas pontas saindo um pouco a esquerda. Quem visse aquilo de relance poderia jurar que era, de fato, algum tipo de ferimento mas olhando mais de perto eram possíveis ver os traços de uma tatuagem.

- A minha Suzuki Hayabusa GSX 1300R está dando alguns probleminhas, acha que consegue consertar? - Perguntou Biker, com um pequeno sorriso em seu rosto.

Moto em questão:

Noah fedia a cigarro e bebidas caras, tanto que Melissa poderia jurar que ele tinha acabado de sair de algum tipo de festa, mas na verdade aquele havia se tornado seu odor natural. Vivia tanto festejando e bebendo que tornara-se sua rotina, acordar e tomar um longo gole de whisky antes de sair para dirigir, não, dirigir não. Pilotar a sua moto. Ele abriu um sorriso gentil para Melissa e cravou seus olhos azuis nos olhos dela.

- Bom, a maior parte do apelido vem porque é mais comum me ver usando meu capacete do que ver meu rosto - Falou Noah com um calmo sorriso, andava tanto de um lado para o outro com sua moto que era impossível vê-lo ficar parado em um único lugar por mais de três dias. No momento que a diversão e a adrenalina de dito lugar acabavam, ele ia embora.

Noah deu alguns passos para trás, para permitir que ela pudesse passar assim que vestisse algo diferente. Ou se ela preferisse ir da maneira que estava mesmo, ele iria acabar gostando ainda mais dela, falta de pudor era algo que atraía Biker para as pessoas, já que isso normalmente simbolizava que a pessoa era qualquer coisa, menos boa.

- E ela é, vermelha sem nem um arranhão. Corre mais que o diabo fugindo da cruz - Ele falou, abrindo um sorriso ao comentar sobre sua moto, aquela Hayabusa era seu orgulho e sua alegria, lembrava-se do dia que a adquirira e nunca mais largara da moto, por mias que tivesse recebido as mais generosas ofertas - Está no estacionamento.

Noah era um cara simples, de gostos simples. Porém caros. Isso era possível notar pelas suas roupas, por mais chamativas que fossem estava claro que elas não eram baratas, assim como a sua moto que chegava a quase vinte mil dólares, dependendo do local onde ela era comprada, obviamente. A questão era que Noah adorava gastar o seu dinheiro, e Deus sabia que isso ele tinha de sobra, vindo de uma família rica e após alguns de seus... trabalhos, em Miami, ele acumulara dinheiro o suficiente para cobrir seus gastos.

- Bom, claro que no calor eu não uso o capacete tão direto assim - Ele falou, com um pequeno sorriso em seu rosto. Ele gostava de usar seu capacete, afinal toda a sua imagem fora criada em cima dele - Sim, eu estava em Miami até um tempo atrás, depois eu vim para cá.

Biker sorriu em aprovação, conforme Melissa passou e preparou-se para segui-la. Ao ouvir o comentário a seguir, Noah até ia falar que talvez soubesse de quem ela estava falando, porém parou antes que pudesse comentar algo, ele não possuía amizade alguma com Maxwell Watson, muito pelo contrário, ele odiava aquele rapaz com todas as suas forças. Mas isso era apenas comum, ele odiava todos que eram amigos de Jack.

- Sim, vamos. Depois podemos dar uma volta nela, se quiser - Disse Noah, conforme seguia Melissa.

Noah apreciava a lealdade que pessoas como Melissa tinham, para ele não havia uma forma melhor de demonstrar gratidão do que ajudar aqueles que um amava. Ele nunca sentira na pele o que era ter uma pessoa como Melissa em sua vida, não por ela ser necessariamente detentora de uma personalidade difícil de se encontrar, mas porque Biker era um solitário por natureza. As bebidas, as drogas e as pessoas que entravam e saíam de seu quarto estavam ali apenas para tentar preencher um vazio que ele sentia dentro de si, ele achara que em Miami conseguiria encher esse vácuo porém até mesmo o ápice de adrenalina não conseguira nada.

- Você era de qual parte de Miami? Da que tinha os russos? - Perguntou Noah, lançando para Melissa um olhar repleto de dúvidas, ele não demonstrava mas aquilo era algo importante.

Biker girava a chave da Hayabusa em seus dedos enquanto caminhava ao lado de Melissa, seus olhos cravados no caminho que estavam seguindo, sua atenção foi apenas quebrada pelo dedo que a garota erguera. Ele parou e observou enquanto ela ia buscar suas ferramentas, para ele era algo tão óbvio que ele deveria ter notado antes, mas absteve qualquer comentário sobre aquilo.

- Não vai me incomodar não. E bom, você vai consertar a moto, nada mais justo que dar uma volta nela - Disse o rapaz, com um pequeno sorriso em seu rosto.

Noah não possuía amigos, sua companhia era apenas desejada para festas e coisas do tipo, mas aqueles que estavam junto dele não poderiam ser chamados nem mesmo de conhecidos, Biker tinha dificuldade em lembrar-se do nome de ditas pessoas, e algumas ele nem mesmo reconhecia. De todas as pessoas no mundo, Noah era uma das poucas que sabia a diferença entre ser solitário e estar sozinho. Sempre havia alguém com Biker, mas ele sempre sentia-se solitário.

- É, eu tinha um primo que morava nessa área, ele me contou sobre algumas coisas que estavam acontecendo por lá, recentemente. Você deu sorte de se mudar antes da hora - A onda de violência que ocorrera na parte de Miami que os russos dominavam já havia se tornado famosa por toda a América, não era incomum ligar a televisão e ver que mais membros da máfia russa haviam sido mortos de uma maneira extremamente violenta.

Quem olhava para Noah via um homem louco, já que pensavam que ninguém com um pouco de sanidade se vestiria daquela maneira, ou faria o que ele faz. A verdade é que ele já havia deixado de se importar com a sua aparência faz muito tempo, desde que era uma criança. Por isso pintara seu cabelo daquele azul ciano, Biker não devia nada para ninguém, portanto ninguém tinha que ficar cuidando da sua vida por ele.

- Sim, está no estacionamento.

( Posto lá sim )

Dante vestiu seu sorriso mais simpático, que na verdade era o seu natural, e esperou que Melissa viesse. Ele a ouvira resmungar alguma coisa do outro lado, mas não conseguiu distinguir muito bem o que era, apenas a palavra fígado, o que já o deixou em um estado de alerta. Ele ouvira rumores sobre Melissa, portanto quando ela abriu a porta ele ficou surpreso. Pelos rumores, ela deveria ter três metros de altura, fogo nos cabelos e a fúria de um demônio. Mas ela era bastante normal, como uma garota que você veria pela rua. Rumores eram realmente exagerados. Ou o Dante que era ingênuo.

- Ah, eu sou Dante Reed, o Max pediu para eu entregar isso - Ele disse, puxando um papel dobrado de seu bolso e entregando para Melissa. Quando a garota o abrisse, veria que estava escrito nele '' Volte quando quiser ''. Após a reação dela, que deveria ser uma de extrema raiva, Dante coçou sua nuca e abriu a boca - Ele disse que... era uma boa ideia eu falar com você...

Quando ela o ameaçou, Dante se encolheu um pouco. O rapaz era inofensivo, incapaz de matar uma mosca, quem dirá aprontar para cima de Melissa. E acima de tudo, ele parecia estar assustado. Não com ela, ou com as ameaças ou com a fama que a perseguia. Ele parecia estar assustado com outra coisa. Algo pior do que Melissa. O rapaz tremia levemente e parecia estar em um estado tão frágil que apenas um toque o quebraria em mil pedaços.

- Não é... uma brincadeira - Ele estava em um estado tão fragilizado que chegava a dar dó de ver - E tem algo que precisa de conserto sim e Max... disse que sua sinceridade vai ajudar a consertar isso aqui - Dante falou, apontando para o lugar onde estava seu coração.

Max sabia que Melissa não era a melhor pessoa com quem Dante poderia conversar, principalmente em uma situação daquelas, porém quando o próprio Max tentara conversar com o loiro, tudo o que ele fizera fora tampar seus ouvidos para a ajuda que o outro rapaz oferecia. Portanto, um pouco da sinceridade de Melissa, e quem sabe um pouco da parte rude dela, era o que Dante mais precisava naquele momento. E também, Max sabia como aquilo iria terminar, Melissa ajudaria Dante e Dante, por sua vez, ajudaria Melissa. Assim era a natureza daquele garoto que assentia e entrava no quarto de Melissa, timidamente.

- Por onde... começo? - Ele perguntou, ficando em pé no centro do quarto.