Campo de futebol

- Acho sim, é uma ótima ideia.

Maxwell abriu um fraco sorriso para ela. Sentia-se estranhamente sem forças nos últimos dias, algo que provavelmente viera do sequestro e da quantidade de álcool que ele ingeria por dia. No geral, algo ruim para ele, mas não é como se Maxwell não fosse uma pessoa que se auto-sabotava a todo momento. Já era um costume dele, estragar tudo para si mesmo. Por mais que tentasse melhorar, tentar deixar de lado aquela persona que criara para si mesmo, de uma pessoa louca, a verdade era que ele estava quebrado demais para tentar fazer algo.

- Eu posso te mostrar algumas coisas depois - Ele então puxou o celular do bolso e começou a mexer nele, até mostrar para ela uma foto do desenho que fizera da Melissa, ou melhor, que ele refizera alguns dias atrás. O original ainda estava com ela - Eu fiz isso, esses dias.

- Acho que vale a pena chamar ela, mesmo que ela não faça algo pelo festival. Só para ela marcar presença mesmo.

Maxwell sabia muito bem o quão esquentada Melissa Carter podia ser, já a vira furiosa ao ponto de partir alguém ao meio e também já a vira esquentada de uma outra maneira. Mas concluiu que não deveria mencionar aquilo para Hanna. Até porque, fora só uma noite de bebedeira, não era algo que iria se repetir. E também para não transformar aquele momento que partilhavam em algo estranho e desconfortável.

- É ela sim, eu desenhei isso quando conheci ela. Eu costumo fazer isso... - Ele falou, então voltando seus olhos para Hanna - Se bem que, eu nunca tive a oportunidade de te desenhar.

- Ela não é tão assustadora assim - O rapaz riu.

Melissa era muito assustadora, ela era como uma chama, consumindo tudo o que era fraco e ficava em seu caminho, quando as pessoas iam para cima dela, eram como ar, apenas alimentando-a e fortalecendo-o. Mas, para algumas pessoas, ela era como a chama de uma fogueira, acolhedora e relaxante. Maxwell já havia experimentado os dois lados, ele havia provocado-a e no processo apenas aumentado a força dela, assim como havia ficado ao lado dela, esquentando-se após dias e momentos frios. Ela certamente não ficaria feliz se soubesse que ele pensava assim dela.

- Acho que só tem mais uma, tirar fotos dos meus trabalhos meio que acaba com o propósito deles - Ele deslizou seu dedo para o lado, havia mais um desenho, uma mulher de cabelos negros estava de pé no meio de uma sala vazia, utilizando um vestido branco que ia até o chão, em seus ombros havia um violino e ela tocava o mesmo. O desenho era vívido, havia vários detalhes no mesmo, as várias dobras do vestido, uma pequena pinta embaixo do olho direito dela, os olhos da mulher estavam semicerrados e, olhando bem, dava para notar que eles eram marrons. Havia, no canto inferior esquerdo da imagem a assinatura de Maxwell - Essa... é a minha mãe - Max falou, olhando para o desenho com muita ternura - Não tenho nada comigo não, desculpa. Podemos tentar em outro momento.

- Se você aparecer com uma armadura, é aí que ela vai ficar puta - Maxwell riu novamente, sabia que tudo o que Hanna falara era verdade, ambos partilhavam essa opinião sobre Melissa.

Maxwell era uma pessoa talentosa e inteligente, porém a sua mente era tão rodeada de problemas que ele não conseguia fazer muito sentido de nada, nem de si mesmo. Em um momento, ele estava agindo como uma pessoa digna de ódio, irritando a todos, falando coisas tão erradas que fazia até mesmo a pessoa mais angelical querer socá-lo. Em outros momentos, ele demonstrava ser uma pessoa cansada da vida, que apenas estava ali... Por estar. A beleza de suas obras era um contraste para o caos que o rapaz era por dentro.

- Sim, ela era. Uma pessoa maravilhosa - Maxwell sorriu tristemente e então guardou o celular novamente, voltando seus olhos para Hanna - O dia que quiser um desenho é só me mandar uma mensagem.

- Eu tenho certeza disso.

Maxwell pousou a mão na cabeça de Hanna e fez um breve carinho, enquanto ria no processo. Melissa Carter era bem assustadora sim, porém ela também sabia ser um pouco amável com certas pessoas, e Hanna Blackwell certamente se encaixava nesse pequeno grupo. Na verdade, ele vinha pensando bastante em Melissa. Ele não sabia dizer exatamente o porquê, mas em vários momentos a imagem dela surgia em sua cabeça, na maior parte do tempo estando extremamente irritada em dita imagem.

- E ela era - Maxwell sorriu amavelmente com aquele comentário - Agora que você fala isso - Maxwell suspirou levemente - Eu também tenho bastante coisas para atualizar.

- Não tem problema, Hanna. Acontece. Na verdade, eu até agradeço você por ter vindo me ver - Ele acariciou a cabeça da garota suavemente, com um sorriso em seus lábios. Aquela vontade que ela tivera de ver Max mostrava o quanto ela se importava com ele, colocando-o na frente de seus estudos e de outras pessoas.

Na realidade, a situação de Max não era muito boa em Blackwell. Apesar de ser um aluno brilhante, ele não era uma das pessoas mais fáceis de se lidar e tinha problemas com pelo menos metade daquele lugar, incluindo professores. Constantes faltas, somadas com sua atitude que estava o mais longe possível da atitude de um bom aluno e com a nova falta de animação faziam com que ele rumasse para um caminho que certamente terminaria com ele expulso do lugar.

- Sim, vamos nos esforçar - Ele disse por final, fechando sua mão ao redor da dela e beijando os dedos da garota - Sim, temos tempo para isso.

- Somos sim - O sorriso de Maxwell aumentou. Na verdade, Hanna estava mais para uma irmã que ele nunca teve. Pelo menos era assim que ele considerava ela, como uma irmã, uma pessoa de sua família. E para Max, não havia nada mais importante do que a sua família, nada naquele mundo possuía um valor maior - Sim, os últimos dias não tem ajudado muito. Mas estou melhorando... Acho.

Maxwell queria ser um violinista, sempre desejara isso. Sua mãe sempre fora sua inspiração nesse sentido, mas quando viera para Blackwell, ele entrara no curso de fotografia. Já não se considerava digno de seguir a mesma carreira de sua mãe. Apesar de não ser tão ruim quanto se fazia ser, Maxwell ainda se considerava um lixo. Portanto escolheu uma área na qual ele tinha uma certa medida de talento e seguiu a mesma, sem pensar muito em seu futuro.

Ele riu suavemente com a reação de Hanna, conforme a mesma se esfregava no rosto dele. Era algo fofo de se olhar, não haviam segundas intenções provindas de Max e muito menos dela. Ambos eram apenas isso, amigos que gostavam muito um do outro.

- Pode ser, mas aquele lugar tá muito ruim.

Maxwell tinha ciúmes de Hanna. Aquela força que ela possuía era algo de se invejar, mesmo tendo atingindo o fundo do poço, ela sempre conseguia se erguer e sorrir novamente, ser aquela pessoa amável que era. Enquanto Maxwell... Bom, ele agradecia ao fato de não ter morrido ainda, fosse por causa das bebidas ou por ter irritado a pessoa errada. Ambos estavam vivos, mas haviam diferenças. Hanna era o dia, sempre animada, alegre e adorável. Já Maxwell estava mais para a noite, silencioso, furtivo e assustador quando perturbado. Maxwell, assim como Hanna, havia atingido o fundo do poço. Mas ele descobrira que o fundo do poço tinha um alçapão.

- Eu tenho certeza que vai - Ele falou, incapaz de se conter o rapaz acabou por acariciá-la novamente, sorrindo gentilmente enquanto o fazia. Hanna era quase como um filhotinho de gato, extremamente fofa e extremamente acariciável.

Ele segurou calmamente a mão de Hanna e levantou-se, puxando a mesma para um abraço de lado. Adorava abraçar Hanna, sentir um pouco daquela energia amigável que fazia com que todos se sentissem mais felizes. Isso certamente valia para ele também. O rapaz conseguia esquecer a maior parte de seus problemas quando conversava com ela, era um efeito único que a garota possuía. A única pessoa que conseguia se aproximar disso era Dante.

- Sim, nós vamos dar conta sim.

Maxwell fingia ser à prova de tudo, à prova de insultos, de golpes, de ameças, do que quer que fosse jogado na direção dele. Mas não era bem assim. Havia um limite para o quanto ele podia aguentar, havia um limite para tudo. Até mesmo um colete à prova de balas acaba cedendo em algum momento, se receber tiros demais. O mesmo acontecera com Maxwell, ele aguentara o que o atingira por diversas vezes, tentando mascarar-se como uma pessoa intocável, insana, que ria da desgraça alheia. Mas isso tudo caíra por terra, ele já não era mais capaz de fingir, já não era mais capaz de aguentar todo aquele ódio.

Em Helhole, ou melhor dizendo, Heaven Gate, ele tentara fazer de si um mártir. Recusava-se a admitir que fora o culpado da morte de sua mãe, algo que ele sabia bem que não fizera. Gale Marie Watson fora uma pessoa amada naquela cidade, por sua extrema devoção a igreja, assim como por seu talento inigualável com o violino. Em um momento de luto e raiva, alguém decidiu culpar Maxwell, e o rapaz sempre negou isso, e continuaria a negar até o fim de sua vida. Ele achava-se culpado por não ter notado a dor de sua mãe, mas certamente não era o culpado de ela ter morrido. No final das contas, ele não se tornara um mártir, não conseguira morrer por algo e certamente não era lembrado por isso. Fora apenas algo que passara pela cidade, que a deixara para trás. Mas logo chegaria a hora de voltar.

- Vamos nessa, irmãzinha - Maxwell sorriu de canto, conforme desciam as arquibancadas.

Maxwell retribuiu aquele abraço com um sorriso terno em seu rosto, gostava do fato de Hanna também o considerar como um irmão. Na verdade, Nathaniel chamava Maxwell de irmãozinho apesar de ambos serem gêmeos. Bom, o outro afirmava ter nascido antes, mas isso dificilmente importava. No final das contas, ter uma irmã não lhe parecia uma ideia tão ruim, na verdade, era uma ótima situação. Sentia-se ainda mais próximo de Hanna com aquilo, com a amizade de ambos fortalecendo-se ainda mais.

- Vamos conseguir sim! - Ele concordou com ela, preparando-se para por a mão na massa.